Qual o real problema do Brasil o desemprego?
A aparente contradição entre o aumento do desemprego e a criação de empregos formais no Brasil, esconde o verdadeiro problema brasileiro
PhD Bertoncello
5/4/20256 min ler


Nos últimos anos, o Brasil tem vivenciado um cenário desafiador no mercado de trabalho, evidenciado pelo aumento sazonal da taxa de desocupação, que alcançou 7,0% no primeiro trimestre de 2025, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. No entanto, dois aspectos merecem maior atenção do que o simples crescimento do desemprego: a tendência, que pode indicar que o movimento não é meramente sazonal, e a geração de empregos formais, bem como sua qualidade, captada pelo Novo CAGED. Interpretar os movimentos estruturais do mercado, para além dos números brutos, é o primeiro passo para desenvolver uma visão crítica sobre as dinâmicas de inserção produtiva no século XXI.
Vamos compreender os dois métodos. A taxa de desemprego divulgada pelo IBGE é calculada com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), que adota os parâmetros da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e fornece uma leitura abrangente da inserção laboral no Brasil. A metodologia considera como desocupadas as pessoas de 14 a 65 anos que, na semana de referência, não estavam trabalhando, mas buscaram emprego nos 30 dias anteriores e estavam disponíveis para assumir uma ocupação. A taxa de desocupação corresponde à proporção de desocupados em relação à força de trabalho (ocupados + desocupados), sendo expressa em percentuais e atualizada mensal ou trimestralmente. Conforme detalhado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2020), esse método oferece uma visão ampla do mercado de trabalho, abrangendo tanto vínculos formais quanto informais, além dos desalentados, e sustenta a interpretação de indicadores como os 7,0% registrados em março de 2025.
Por outro lado, o Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo CAGED), implementado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) a partir de 2020, é a principal ferramenta de monitoramento do mercado de trabalho formal no Brasil, com foco nos vínculos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Sua metodologia integra três sistemas administrativos: o eSocial, que consolida informações fiscais e previdenciárias; o CAGED Simplificado, voltado a pequenos empregadores; e o Empregador Web, que registra dados sobre o seguro-desemprego. As empresas devem declarar admissões e desligamentos até o 7º dia do mês seguinte, conforme o Decreto nº 10.854/2021, garantindo coleta contínua e automatizada. Os dados são validados pela Subsecretaria de Estatísticas e Estudos do Trabalho (SEET) e resultam em indicadores como admissões, desligamentos, saldo líquido, estoque de vínculos e salário médio de admissão. As informações são desagregadas por setor econômico (CNAE 2.0), localização geográfica, gênero, faixa etária e raça/cor, permitindo análises detalhadas sobre o perfil das vagas criadas.
Como é possível haver aumento do desemprego e, ao mesmo tempo, criação de milhares de empregos? A coexistência entre a elevação da taxa de desocupaçãoque chegou a 7,0% no trimestre encerrado em março de 2025, segundo a PNAD Contínua e a geração de 654.874 empregos formais no mesmo período, conforme o Novo CAGED, é explicável à luz das diferentes metodologias adotadas. A PNAD Contínua considera toda a força de trabalho (ocupados e desocupados), incluindo trabalhadores formais e informais, e classifica como desocupadas as pessoas que buscaram ativamente emprego, mas não estavam ocupadas. Já o Novo CAGED registra apenas vínculos formais regidos pela CLT, contabilizando o saldo líquido entre admissões (2.579.192) e desligamentos (2.147.197) no primeiro trimestre de 2025, sem captar o movimento do setor informal, que representa aproximadamente 40% da ocupação no país (IBGE, 2024).
Dessa forma, quem desconhece as metodologias utilizadas corre o risco de interpretar equivocadamente os dados, desenvolvendo uma visão distorcida, seja negativa ou positiva, da realidade do mercado de trabalho. Para superar esse impasse, é necessário ir além das manchetes e observar os indicadores de forma integrada. A seguir, analisaremos a tabela comparativa entre os métodos e, com base nela, buscaremos compreender com mais precisão para onde caminha o Brasil em termos de ocupação e desenvolvimento.


A primeira coluna da tabela revela uma tendência consistente de queda na taxa de desemprego desde o pico observado durante a pandemia de COVID-19. Como era esperado em um cenário de recuperação, a desocupação seguiu em declínio ano após ano. No entanto, caso o comportamento de 2025 se mantenha nos próximos trimestres, essa tendência poderá se reverter, sinalizando uma possível retomada no crescimento do desemprego, o que exigirá atenção às causas estruturais e conjunturais desse movimento.
O Novo CAGED, por sua vez, registrou seu único saldo negativo durante o período crítico da COVID-19, seguido por uma recuperação acentuada. Apesar do pessimismo e da ameaça de uma nova crise, tudo indica que 2025 deve encerrar com ao menos 1 milhão de novos empregos formais gerados. O dado mais expressivo, no entanto, está no avanço das contratações no setor público. Atualmente, o Brasil possui mais de 2,8 milhões de servidores ativos e, entre 2023 e 2024, foram incorporados mais de 100 mil novos funcionários públicos. No mesmo período, o número de empregados com carteira assinada no setor privado passou de 36,2 milhões, com crescimento de 3,3%, enquanto o funcionalismo público cresceu 3,45%, sem que se observe, até o momento, uma melhoria proporcional nos serviços prestados à população.
Por fim, a dinâmica da população em idade laborativa, compreendida entre 14 e 65 anos, é talvez a mais preocupante. O país enfrentará uma escassez crescente de mão de obra jovem, reflexo direto da redução do “estoque” populacional nessa faixa etária, cujas projeções do IBGE (2020) apontam para um declínio contínuo. Ao mesmo tempo, a população com 65 anos ou mais crescerá significativamente nos próximos cinco anos, ampliando a pressão sobre os sistemas previdenciário e produtivo. Como consequência, o número de pessoas aptas a trabalhar deixará de crescer por volta de 2030 e, em 2035, já será inferior ao atual: estima-se que passará de 148 milhões em 2025 para 147,6 milhões em 2035.


Resumindo
Os dados do IBGE, quando coletados conforme a metodologia estabelecida, são tecnicamente confiáveis. No entanto, é importante lembrar que o conceito de desempregado se refere exclusivamente às pessoas que perderam o emprego ou estão buscando uma ocupação nos últimos 30 dias, em relação ao total de pessoas empregadas. Assim, a taxa de desocupação não contempla os inativos ou desalentados. Além disso, as tendências de alta ou baixa costumam seguir ciclos longos, especialmente em economias como a brasileira, onde os processos de contratação e demissão são complexos, onerosos e marcados por elevada rigidez regulatória.
O Novo CAGED revela dados preocupantes: a criação de empregos formais no Brasil vem perdendo ritmo nos últimos trimestres. A única categoria com crescimento consistente é a dos funcionários públicos, o que levanta alertas em termos fiscais e de eficiência. Essas contratações pressionam as contas públicas no longo prazo e, embora ampliem o quadro de servidores, não têm refletido em melhorias perceptíveis na qualidade dos serviços prestados à população. Na prática, o aumento do funcionalismo público representa uma elevação obrigatória dos gastos governamentais, sem necessariamente gerar retorno social proporcional.
E, por fim, chegamos ao limite da transição demográfica: em 2026, o número de pessoas com 65 anos ou mais superará, pela primeira vez, o total de menores de 14 anos. Já em 2030, a força de trabalho deixará de crescer, marcando o fim do Brasil jovem que conhecemos no passado. Inicia-se, então, a era de um país envelhecido, com baixa capacidade produtiva e crescente pressão sobre os sistemas previdenciário e de saúde. Sem reformas estruturais profundas, esse processo pode consolidar um cenário de estagnação, onde o envelhecimento se combina à estagnação econômica, o que nos levaria ao risco real de uma pobreza permanente.
Bella Investimentos
Consultoria financeira para proteção patrimonial nos EUA.
Contato
E-books
contato@phdbertoncello.com
+55 18 99710-4753
© 2025. All rights reserved.