O Surto de Influenza Aviária no Brasil: Impactos na Avicultura e Desafios para o Agronegócio
PhD Bertoncello
5/22/20255 min ler


Introdução
O agronegócio brasileiro, pilar fundamental da economia nacional, enfrenta um desafio significativo em 2025 com o primeiro surto de influenza aviária de alta patogenicidade (H5N1) em uma granja comercial, registrado em Montenegro, Rio Grande do Sul. Este evento, confirmado em 15 de maio de 2025, rompeu a barreira que até então limitava os casos brasileiros a aves silvestres, desencadeando uma crise que transcende o âmbito local e impacta o comércio internacional. Com o Brasil como líder mundial na exportação de carne de frango, responsável por cerca de 35% do mercado global, as consequências econômicas são profundas, marcadas por embargos de mais de 30 países e pressões sobre a cadeia produtiva. Este artigo analisa o ocorrido, os volumes de consumo interno e externo de frango e ovos, os impactos das restrições às exportações, e as falhas governamentais que agravam a situação, oferecendo uma reflexão crítica sobre o futuro do setor avícola.
Os impactos
O surto de influenza aviária em Montenegro foi identificado em uma granja de matrizes com 17 mil aves, destinada à produção de ovos férteis para frangos de corte. A mortalidade foi devastadora, atingindo 100% em um galpão e 80% em outro, com as aves sobreviventes sacrificadas para conter a disseminação do vírus. Concomitantemente, um foco foi detectado no Zoológico de Sapucaia do Sul, a 50 km, onde aproximadamente 90 aves aquáticas morreram. A resposta do governo incluiu a decretação de emergência zoossanitária por 60 dias, a instalação de barreiras sanitárias em um raio de 10 km, a destruição de ovos rastreados em três estados (Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais), e a desinfecção da granja. Até 19 de maio, 55% das 510 propriedades na zona de vigilância foram inspecionadas, com um caso suspeito em análise. Apesar do controle local, o impacto internacional foi imediato: mais de 30 países, incluindo China, União Europeia, México, Coreia do Sul, Canadá, Argentina, Chile e África do Sul, suspenderam importações de produtos avícolas brasileiros, enquanto Japão, Arábia Saudita e Emirados Árabes limitaram as restrições a Montenegro ou ao Rio Grande do Sul.
A avicultura brasileira é um setor robusto, com projeções para 2025 de 15,3 milhões de toneladas de carne de frango e 59 bilhões de unidades de ovos. O consumo interno absorve 9,9 milhões de toneladas de frango (64,7% da produção), equivalente a 46,6 kg por habitante para uma população de 213 milhões, e 58,4 bilhões de ovos (99% da produção), ou 272 unidades per capita. As exportações, por sua vez, respondem por 5,4 milhões de toneladas de frango (35,3% da produção), gerando US$ 9,928 bilhões em 2024, e 600 milhões de ovos (1% da produção), com crescimento projetado de 62% em 2025 devido à crise nos Estados Unidos. Esses números destacam a resiliência do mercado interno, mas também a vulnerabilidade do setor às interrupções no comércio exterior, especialmente em mercados-chave como China (18,3% das exportações), Japão, Emirados Árabes, Arábia Saudita e México.
As restrições impostas por mais de 30 países afetam 33,5% da receita de exportação de frango, equivalente a US$ 3,26 bilhões em 2024, com perdas mensais estimadas entre US$ 100 milhões e US$ 200 milhões, podendo alcançar US$ 1 bilhão anuais se persistirem. O excedente de aproximadamente 1,8 milhão de toneladas de frango, que não será exportado, pressiona o mercado interno, que já consome 64,7% da produção. Esse aumento de oferta pode reduzir os preços em 10% a 15% nos próximos dois meses, beneficiando consumidores, mas desafiando produtores, especialmente pequenas e médias empresas. Grandes players, como BRF e JBS, enfrentam custos elevados de armazenagem e dificuldades para redirecionar estoques, enquanto a ausência de novos mercados no curto prazo intensifica a pressão sobre a cadeia produtiva. No caso dos ovos, o impacto é mínimo, dado que as exportações representam menos de 1% da produção, mas a suspensão em mercados como China e Chile reflete a fragilidade do comércio exterior.
A gestão governamental, embora tenha respondido rapidamente com medidas de contenção, é alvo de críticas por falhas estruturais que comprometem o agronegócio avícola. A insuficiência de investimentos em biossegurança é uma questão central, com o Plano Nacional de Prevenção à Influenza Aviária recebendo recursos limitados para fiscalização de granjas e monitoramento de aves migratórias, principais vetores do H5N1. Pequenos produtores, em particular, carecem de treinamento e infraestrutura adequados. A comunicação com parceiros comerciais foi considerada tardia, mesmo dentro dos prazos da Organização Mundial de Saúde Animal, gerando embargos totais desnecessários, como o da China, que ignorou acordos de regionalização. As negociações para limitar restrições a Montenegro ou ao Rio Grande do Sul avançam lentamente, refletindo ineficiências diplomáticas. Além disso, a ausência de medidas de apoio financeiro, como linhas de crédito ou subsídios, deixa avicultores vulneráveis a preços baixos e custos crescentes de insumos, com milho e soja 20% mais caros em 2025. Por fim, o governo não capitalizou lições de crises internacionais, como a disseminação do H5N1 nos Estados Unidos, o que poderia ter antecipado estratégias de prevenção e mitigação.
Resumindo
O surto de influenza aviária em Montenegro, Rio Grande do Sul, expõe tanto a força quanto as fragilidades do setor avícola brasileiro. O robusto consumo interno, que absorve 64,7% da produção de frango e 99% da de ovos, oferece uma rede de segurança frente aos embargos de mais de 30 países, que comprometem 33,5% da receita de exportação. Contudo, o excedente exportável pressiona a cadeia produtiva, reduzindo margens e desafiando a logística do setor. As falhas governamentais, incluindo subinvestimento em biossegurança, comunicação ineficaz, lentidão diplomática, falta de apoio aos produtores e despreparo para crises globais, amplificam os impactos econômicos e ameaçam a competitividade do Brasil no mercado internacional.
Este episódio, portanto, deve ser entendido não como um evento isolado, mas como um alerta. Se o Brasil deseja manter sua posição de liderança no mercado global de proteínas, será necessário adotar uma abordagem mais profissional, técnica e estratégica na gestão das questões sanitárias, comerciais e diplomáticas. A recorrência de erros como os observados em Montenegro coloca em risco não apenas os interesses do agronegócio, mas também a credibilidade internacional do país e sua capacidade de competir em mercados cada vez mais exigentes e regulados.
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